Capítalo 11: Como Eles Governam

Rodapé: A Anatomia da Explotação [1]

A elite capitalista excuta o seu empreendimento econômico por meio de suas corporações transnacionais de responsabilidade limitada. No entanto, para fazer isso, requer a força de um estado soberano para restringir e explotar fisicamente os habitantes e os recursos do planeta.
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Conceitualmente, um estado soberano é como uma casca esférica. Inclui um es­paço finito (seu próprio território soberano) e exclui um espaço infinito (o resto do universo). Sua finalidade é facilitar a subjugação e explotação, pela minoria da elite, dos recursos e habitantes de ambos os espaços. O estado soberano, portanto, compreende os mecanismos necessários para formular, agilizar e fazer cumprir as leis e políticas para alcançar especificamente as ambições egoístas da minoria elitista.

Embora, em princípio, o objetivo seja o mesmo em ambos os casos, a metodologia para subjugar e explotar o que está dentro e o que está fora de um estado sober­ano é, necessariamente, um pouco diferente.

Explotação Interna

O modelo sistêmico de subjugar e explotar os habitantes e recursos, que se en­contram dentro da casca, é o de um reino ou república.

Antes que um reino exista, cada família nuclear das pessoas que vivem em uma determinada região geográfica, como a Grã-Bretanha, é capaz de usar livremente uma quantidade necessária e suficiente de terra para transformar seu trabalho em suas necessidades de vida. Logo, porém, em cada localidade, surge um indivíduo exigente, que subjuga os que o cercam, acabando por desapropriar cada família de seus recursos necessários e suficientes. Assim, ele torna toda a terra da localidade sua posse pessoal.

Entre esses indivíduos exigentes na região como um todo, os mais fortes então atacam os mais fracos até que as propriedades fundiárias estabilizem-se em tam­anho, de acordo com várias restrições geográficas e administrativas. A região gravita assim em direção a um pequeno número de propriedades fundiárias, cada uma dirigida por um indivíduo exigente que poderíamos, para fins de argument­ação, chamar de barão. O barão mais dominante é então eleito rei por seus pares ou arbitrariamente encarrega-se do carisma superior. Ele, então, torna-se rei da região geográfica, que assim, torna-se um reino ou estado soberano.

Com muito pouca briga ou dissidência, tal forma de reino pode permanecer estável por muito tempo. Pode sofrer uma tentativa de invasão por outros reis, mas geralmente os barões podem viver a vida abastada alimentada pela labuta de seus súditos, que se devem contentar com sua miséria.

Inevitavelmente, a industrialização chega. Os processos agrícolas dos latifúndios tornam-se mecanizados. Menos trabalhadores humanos são necessários. A maioria está deslocada. Fabricação agora requer trabalhadores. A maioria é, portanto, forçada a mudar-se para as cidades para trabalhar em fabricação e distribuição. Para este fim, habilidades industriais são necessárias. Então as pessoas devem ser educadas e treinadas. Isso precipita a consequência colateral indesejável, que eles aprendam a pensar. Eles agora vêem e compreendem seu estado miserável, que, por sua vez, os inspira a buscar controle sobre suas vidas. Eles exigem democracia.

O rei é marginalizado como um mero chefe de Estado simbólico ou a instituição da monarquia é abolida por completo. Os barões tornam-se uma elite industrial. Mas o povo ainda está sem o poder proporcionado pela posse e uso desimpedido da terra e dos recursos terrestres primários. O homem comum fica, portanto, sem recursos suficientes para apresentar-se como um representante democrático. Ele não tem meios para competir em uma campanha política, para tornar-se conhecido e con­fiável. Somente os membros da elite latifundiária têm os meios e conexões neces­sárias, para apresentarem-se (ou as suas marionetes escolhidas), nas eleições democráticas, a uma grande população industrializada.

Consequentemente, as políticas da elite são poderosamente vendidas às massas crédulas, que são, propositalmente iludidas, que o melhor para a elite também é o melhor para elas. Mas nada muda. O homem comum ainda é o escr­avo da elite. Ele pode ser, teoricamente, livre para escolher qual mestre individual ele serve, mas ainda, está ligado ao sistema industrial como um todo. Ele deve servir alguém para sobreviver. A obrigação de procurar e encontrar trabalho é im­posta a ele, seja ou não um mestre que precise de seu trabalho. O homem comum, portanto, vive em um estado de explotação sem fim. Para proteger-se contra a insurreição social, a elite fornece uma ninharia para aqueles incapazes de encon­trar trabalho ou são incapazes de trabalhar.

Mas as consequências são inevitáveis. Eventualmente, os jovens, nascidos de muitos explorados na disparidade inescapável de riqueza e oportunidade, reagem à sua situação. Eles vão em fúria: às vezes em escala nacional. Eles causam estragos e destruição. Mas os fantoches da minoria exigente nunca podem ver a causa. Eles pensam que os desordeiros são simplesmente descontentes, que devem ser punidos por gentileza com mão firme. A maioria explorada de uma nação é mantida sob a força de um sistema inexpugnável de coação, que não tem massa crítica para quebrar. Eles podem causar interrupções significativas às vezes. Mas o status quo é sempre restaurado.

Explotação Externa

O modelo sistêmico de subjugar e explotar os habitantes e recursos, que se en­contram fora da casca é, por um lado, o de um império mundial ou, por outro lado, o da economia dominante dentro de um mercado livre global e neoliberal.

O império financia e despacha exploradores e aventureiros para os "quatro cantos" da Terra, para buscar e pesquisar recursos econômicos úteis, como ouro, pedras preciosas, frutas e outros recursos não disponíveis ou naturais na pátria. Em seu rastro, o império envia expedições comerciais como meio de comprar esses re­cursos descobertos pelo proverbial "preço de uma banana".

Mais cedo ou mais tarde, no entanto, os povos dos territórios explotados perce­berão, que estão sendo enganados. A disparidade aumenta. A pobreza instala-se. A agitação instala-se. O império envia uma frota naval com um exército e administra­dores civis para impor a ordem. Eles assumem o território, estabelecendo e aplic­ando o sistema de leis do império. As terras explotadas tornam-se assim países sujeitos ao império. O império expande-se, dessa maneira, até que o sol nunca nele se põe. Eventualmente, sob seu próprio peso e custo de administração remota, ex­acerbado pela crescente agitação local, o império desmorona e seus antigos súdi­tos tornam-se estados independentes mais uma vez.

No mundo de superpotências de hoje, com visões políticas fortemente contrast­antes, sob a constante ameaça militar de destruição mutuamente assegurada, a construção declarada de impérios não é mais viável.

Não obstante, se tal superpotência se sentir ameaçada pelo mundo, seja essa ameaça real ou imaginária, ela poderia ser motivada a invadir e subjugar vizinhos mais fracos para fornecer um amortecedor para sua própria proteção, enquanto o resto do mundo simplesmente o vê como um agressor manifesto.

A invasão militar não é mais aceitável para a opinião pública mundial. Mas matar pessoas lentamente através da pobreza e fome induzidas economicamente é aceit­ável. Isso porque, na mente superficial do público global, o efeito está suficiente­mente dissociado da causa para não suscitar indignação.

Assim, para explotar os re­cursos e habitantes do planeta, um predador deve empregar uma metodologia mais sofisticada e clandestina. Para isso, precisa da ajuda de tecnologia mais atual­izada, tanto para buscar e pesquisar os recursos desejáveis do planeta, quanto para ouvir os pensamentos de sua presa.

Consequentemente, do anonimato do espaço, os satélites do predador espionam analiticamente a superfície abundante do nosso planeta. Eles sondam entre as nuvens com suas câmeras de alta definição, sensores infra-vermelhos e radares. Roboticamente mapeiam áreas de terra e mar, onde encontram-se minerais extr­aíveis, petróleo e gás. E abrigados por trás desses satélites, mentes neoliberais cruéis contemplam com olhos invejosos essa colcha de retalhos de lucro, despre­ocupados em relação à destruição colateral e à pobreza que suas façanhas caus­arão nessas terras, mares e seus habitantes.

Com cálculo frio, eles escolhem uma área para explotar. Eles investigam a política da jurisdição soberana em que se encontra. Se for um regime elitista empunhando a mão forte de um líder despótico ou senhor da guerra sobre seu povo comum, eles negociam um acordo comercial com sua elite para abrir mão do patrimônio agrícola e geológico do país pelo preço de uma banana, lubrificando o processo com copiosas propinas para aqueles no controle. As pessoas comuns perdem seus meios de transformar seu trabalho em suas necessidades de vida. Os ricos tornam-se cada vez mais ricos. Os pobres caem-se cada vez mais pobre. A disparidade con­tinuamente aumenta. E assim a roda gira.

Por outro lado, se a área está dentro da jurisdição de um regime de esquerda, cujos líderes seguem uma obrigação moral de cuidar de suas pessoas comuns, o pro­cesso é um pouco mais complicado.

Eles devem primeiro vasculhar a paisagem política do país para encontrar o inevit­ável caldeirão dos fanáticos direitistas randianos[2], que não se importam com o povo comum, mas apenas em maximizar sua própria riqueza e promover seus pró­prios interesses. Eles, então, despejam grandes quantias de dinheiro neste grupo incipiente, fornecendo-lhe toda a perícia externa necessária, para promover-se com força suficiente, precipitando uma eleição geral e, democraticamente, arran­car o poder do governo ou partido socialista estabelecido. Nos países socialistas menos desenvolvidos, ou em qualquer país onde a democracia não funciona, eles finan­ciam o armamento de um bandido ou senhor da guerra local, para impor seu desejo de explotar os recursos do país.

Eles, então, induzem 'suas presas' em seu mercado-livre global. Ao deliberada­mente, tornar mais barato importar vários bens essenciais, como tecnologia e medicina, eles tornam 'suas presas' vitalmente dependentes do mercado externo. Eles, tam­bém, prendem suas vítimas em contratos de longo prazo, para usar a maior parte de suas terras produtivas, com o fim de exportar produtos agrícolas, enquanto importam ali­mentos essenciais. Assim, não tem mais a infra-estrutura baseada no terra pátria, para suprir todas as necessidades de sua população. Torna-se, vitalmente, dependente do comércio internacional.

Assim, no caso de um ressurgimento da esquerda, essas mentes neoliberais cruéis, simplesmente, aplicam sanções comerciais, para impedir a entrada de mercadorias vitais e orquestrar interrupções na infra-estrutura e nos serviços. Isto causa miséria e dificuldades incalculáveis para a população. A grande maioria, portanto, fica in­satisfeita com a nova esquerda, que inevitavelmente resulta em uma insurreição popular contra ela e no restabelecimento do fantoche randiano[2].

Caso o regime esquerdista consiga, de alguma forma, conter e reprimir a insur­reição popular, estas mentes neoliberais cruéis podem empenhar-se em esquemas malandros apoiados pelo Estado, para assassinar um líder esquerdista inamovível por meios modernos, que não podem ser rastreados. Se isto falhar, eles têm o poder de pressionar o governo de sua poderosa pátria a montar — ou pelo menos ameaçar montar — uma invasão militar justificável no país, para "resgatar" seu povo do socialismo e restabelecer seu fantoche direitista.

Eles, então, continuam a subsidiar a manutenção do novo status quo direitista, pressionando o governo fantoche a concordar em abandonar a herança socio-econômica do país pelo preço de uma banana, dando-lhes propinas copiosas para a elite local. Eles finalmente esgotam os recursos do país, deixando uma minoria rica, enquanto a maioria afundanda em pobreza cada vez pior.

Embora essas mentes neoliberais cruéis possam ser psicopatas-intelectuais, sem sentir nenhum remorso pelos devastadores efeitos colaterais de seus esforços, pre­cisam apresentar uma justificativa moral convincente, para suas populações de origem. Eles fazem isso através da doutrina, obviamente falha, do Destino Manif­esto, que afirma, que eles são um povo superior, escolhido por um ser onipotente, para governar o resto de uma humanidade inferior.

Mas a explotação implacável no mundo externo também tem consequências. Contra a expropriação forçada, a disparidade e a pobreza, as pessoas eventual­mente não têm escolha a não ser reagir. É uma questão de sobrevivência. E tal reação pode desencadear em diferentes e desconectadas partes do globo dentro de culturas radicalmente diferentes. Mas ninguém tem recursos para travar uma guerra contra uma superpotência neoliberal a fim de evitar que sua nação seja esvaziada de seus recursos naturais. Portanto, só há uma maneira pela qual eles podem reagir. E isso por uma campanha contínua e implacável de ataques arbit­rários e esporádicos à sociedade que os explora.

De um lado, está a tecnologia militar amplamente superior com meios ostensiva­mente robóticos para fazer o trabalho sujo enquanto seus operadores humanos estão escondidos com segurança a milhares de quilômetros de distância. Do outro lado, está o desespero econômico que impulsiona a busca pela libertação da exploração alimentada por um fanatismo religioso kamikaze em pessoas que ficar­am sem nada a perder. E os povos explorados do mundo estão agora muito além da massa crítica. Eles não podem ser contidos. Portanto, a guerra eterna continuará e crescerá em escalada super-regenerativa até que ambos os lados sejam quebrados. Esse é o futuro inevitável, a menos ou até que a causa seja removida pela cessação da exploração econômica implacável dos povos deste planeta.

A Solução de Caridade

O resultado de pessoas serem expulsas de suas terras por senhores da guerra de culturas comerciais auxiliados e estimulados por potências do primeiro mundo é a extrema privação, miséria, doença e fome que vemos no mundo hoje. Então, qual é a solução da Elite Ocidental para esta crise de sua criação? Caridade. Mas não por eles. Eles encorajam a formação de vastas instituições de caridade corporativas que usam todas as técnicas orientadas pela psicologia do marketing de massa corp­orativo para influenciar as mentes das pessoas comuns — incluindo pessoas muito vulneráveis — para contribuir com tudo para salvar os pobres e famintos do mundo. Ao mesmo tempo, a própria elite psicopata se deleita em sua riqueza obscena.

Essas instituições de caridade corporativas bombardeiam pessoas com salários de sobrevivência com avalanches de correspondências com fotos patéticas de crianças doentes morrendo de fome que magoam a consciência. Eles também os bombard­eiam com intermináveis telefonemas, pelos quais qualquer outro perpetrador seria preso por assédio telefônico. E se você der a um, seu nome será passado para cent­enas de outros que então o importunarão até a morte para sempre. Eu conheço pessoalmente dois casos distintos em que senhoras idosas — ambas com Alzheimer — foram implacavelmente visadas por essas instituições de caridade até que uma delas literalmente não tivesse absolutamente nenhum dinheiro para sustentar sua vida. A única solução era sua família se certificar de que ela nunca teria dinheiro e fornecer todas as suas necessidades em espécie.

Conclusão

A pobreza, miséria e disparidade criadas pelo Ciclo Vicioso da Explotação Global. O ciclo vicioso vergonhoso pelo qual a elite corporativa e seus investidores expl­otam impiedosamente os povos e os rec­ursos deste planeta é mostrado à direita. As corporações ocidentais financiam dita­dores militares implacáveis do Terceiro Mundo para comprar equipamentos milit­ares avançados com os quais subjugar seu povo e removê-lo de suas terras. As pessoas, portanto, não podem mais aum­entar suas necessidades de vida e, con­sequentemente, são lançadas em um estado de pobreza e fome. Os ditadores militares então deixaram o Agronegócio Corporativo usar a terra assim desocup­ada para cultivar colheitas baratas e ex­trair minerais que eles levam ao Ocidente e vendem às populações ocidentais a preços ocidentais, obtendo assim um alto lucro para seus investidores.

A graxa política que faz girar as rodas dessa máquina rançosa é fornecida pelos canais diplomáticos dos governos ocidentais.

A mídia noticiosa conscientiza o povo do Ocidente sobre a pobreza e a miséria em que vivem os povos do Terceiro Mundo. As instituições de caridade corporativas então montam apelos nos quais aplicam todas as técnicas psicológicas do mark­eting comercial para chantagear emocionalmente as pessoas comuns de baixa e média renda do Ocidente para cavar fundo em seus pequenos bolsos para ajudar esses pobres do Terceiro Mundo que foram empurrados para essa situação. por seus implacáveis ditadores militares, que "de alguma forma" parecem ter adquirido todo o armamento ocidental avançado de que precisam para manter seu estado de opressão.

Excelente para os acionistas corporativos do Oeste. Bom para os implacáveis dita­dores militares do Terceiro Mundo. Doloroso para as pessoas do ocidente, dom­inadas pela consciência. Inferno absoluto para os desafortunados habitantes do Terceiro Mundo. Assim, vão à igreja os investidores corporativos para agradecer ao Senhor por sua generosa bondade.

Acho que é o investidor corporativo que deve pagar para corrigir a crise human­itária que ele criou. Levaria apenas uma pequena parte do lucro obscenamente alto que ele adquiriu tão maliciosamente.

É sempre uma fonte de espanto para mim que essa noção nunca pareça passar pela mente do ocidental comum. Talvez ele apenas engula passivamente a doutrina thatcherista de que o investidor corporativo adquiriu seu lucro obsceno por "mérito" e, portanto, merece mantê-lo, deixando com razão as hordas sem mérito [i.e. os de baixa renda] para pagar a conta. É somente por meio dessa doutrina de extern­alização que as corporações podem sobreviver sistemicamente. Sem ela, eles se desintegrariam rapidamente.


Este ensaio descreveu os princípios abstratos da explotação. Deve ser óbvio para qualquer mente, capaz de pensamento independente, que, ao longo das décadas de memória viva, este princípio foi aplicado. E, em vista de tais eventos, deve caber ao leitor decidir, com clara consciência, se tal comportamento é aceitável ou não.


Documento Superior | © abril de 2019 Robert John Morton
Traduzido por Dayse do Nascimento Silva

  1. Explotaçaõ: O ato, de um país fortemente desenvolvido, de pressionar ou enganar um país mais fraco ou menos desenvolvido a vender os seus recursos naturais por um preço injustamente baixo.
  2. Randiano: discípulo da filosofia sócio-econômica do "Objetivismo" de Ayn Rand.